O sol se infiltrava entre as folhas e ele ria. Ria com gosto, esquecido por um instante do que pesa no corpo. Tão bonito.
Contava histórias com gestos largos, exagerados, como se a vida coubesse inteira nas suas mãos.
A cor voltava devagar ao rosto, os olhos brilhavam.
GD'Art
As mãos dela, pequenas, absurdamente pequenas - mãos de bonequinha de biscuit - seguravam a taça de vinho, sustentando o instante.
Quem passasse e visse a cena não suspeitaria da quimioterapia.
Do que ele falava? Já não lembro, tão absorta estava.
Palavras são ondas: vêm, quebram, se dissolvem.
O que ficou foi o som da risada,
o gesto,
o brilho,
o milagre provisório de estar ali – inteiro.
E no fundo da minha mente (ou do meu coração?) Caetano cantava, suavemente: “Existirmos: a que será que se destina?”
GD'Art
Mas foi ali, no jardim, que finalmente entendi.
O estoicismo verdadeiro torna tão pequenas as palavras. Está no corpo que resiste, na carne que sorri, no olhar que não se curva. Nas despedidas disfarçadas de encontros, na beleza que às vezes vem para partir logo depois.
Estoicismo.
Ele é imenso quando encarnado.
É um homem rindo ao sol, mesmo sob sentença.
É uma mulher amando no presente, como quem segura o tempo.
A vida - leve, etérea - passava entre as folhas, como luz, como som, como vinho.
A matéria é fina. Papel de seda.
Carpe diem.