O cristianismo, em seu início, era bem diferente do catolicismo de hoje, em matéria de fé. Não se cogitava, nos primórdios da era cristã, da Santíssima Trindade, “mistério” que só mais de três séculos depois da morte de Cristo passou a fazer parte da religião católica.
Qual é a origem dessa crença?
Colosso de Constantino, Museu Capitolino, RomaD. Miller
Flavius Aurelius Claudius Constantinus, ou simplesmente, Constantino, o Grande (nascido entre 280 e 288 e falecido em 337), às vésperas da batalha da Ponte Mílvia, ocorrida em 28.10.312, teria visto no céu, de acordo com seu biógrafo Eusébio Pânfilo (ca. 265-339), uma cruz com dizeres em grego que a tradição manteve em latim: “In hoc signo vinces”, isto é, “com este sinal vencerás”. Constantino mandou pôr nos escudos de seus soldados essa frase, antes da batalha da Ponte Mílvia. De fato, Constantino venceu seu inimigo Maxêncio nessa batalha, mas foi só em 324, ao vencer Licínio, que Constantino se tornou senhor absoluto de todo o Império Romano, depois de ter garantido, pelo Edito de Milão (313), o cristianismo como religião oficial do Império. Vendo que Roma não era mais um bom lugar para sede do Império Romano, ele construiu no lugar em que se encontrava Bizâncio (hoje Istambul, na Turquia), a nova sede do governo, Constantinopla, a capital do Império Romano do Oriente, conhecido como “Império Bizantino”. Foi durante o seu reinado que se construíram os primeiros monumentos cristãos, como a igreja do Santo Sepulcro, em Jerusalém, a igreja de Santa Sofia, em Constantinopla, a basílica do Vaticano e a igreja dos Santos Apóstolos, em Roma, entre outros.
Em 325, no primeiro Concílio de Niceia, sob o papado de Silvestre I, Constantino condenou as ideias e os seguidores do egípcio Arius, sacerdote de Alexandria, fundador do arianismo, que negava a igualdade de natureza entre o Pai e o Filho, e não reconhecia divindade em Jesus Cristo. Foi durante esse Concílio, em que se estabeleceram os dogmas principais do catolicismo, que houve uma discussão: Jesus seria apenas mais um profeta, como entendiam os judeus, além de Arius, ou seria um Deus?
Primeiro Concílio de Niceia, no ano 325 (afresco), VaticanoG. Guerra, C. Nebbia, 1590
Fausta, filha de Maximiano, era casada com Constantino desde 307. Ela queria que Jesus fosse considerado Deus, apesar da relutância de Constantino. Mas ela lembrou-lhe o sinal que ele havia recebido e a vitória que ele acreditava ter sido o resultado de uma intervenção sobrenatural. Constantino concordou. Por votação, Cristo foi considerado Deus nesse primeiro Concílio de Niceia. Isto é: foi por votação que Jesus Cristo foi considerado Deus.
Sermão da Montanha
Carl H. Bloch, 1877
O Espírito Santo, que era sugerido não como Deus, mas como manifestação de Deus para justificar a virgindade de Maria, tornou-se dogma de fé e o terceiro Deus católico no Concílio de Constantinopla, em 381 (sob o papado de Damaso I). Esse Concílio voltou a condenar as ideias de Arius.
Acredito que Jesus Cristo tenha recusado, implicitamente, ser considerado Deus. Em Mt.24:34-36, lê-se: “Em verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas essas coisas aconteçam. O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar. Porém daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas unicamente meu Pai.” A onisciência, a onipotência e a onipresença são atributos de Deus, e, portanto, têm valor absoluto. Deus sabe tudo, pode tudo e está em toda parte (se o inferno existe, então Deus, por estar em toda parte, está também no inferno). Ora, a onisciência é o saber absoluto sobre todas as coisas. Se o Filho não sabe algo que apenas o Pai sabe, então o Filho não é onisciente e, portanto, não é Deus.
Pensemos nisso.