Numa aula-conferência sobre Luís de Camões e seu poema épico Os Lusíadas, o professor e acadêmico da Academia Paraibana de Letras ...

O professor escritor

Numa aula-conferência sobre Luís de Camões e seu poema épico Os Lusíadas, o professor e acadêmico da Academia Paraibana de Letras Milton Marques Júnior falou, repetidas vezes, não ser escritor, mas professor. Um professor escritor que escreve para ministrar as aulas.

“O que sempre desejei e sou é professor. A escrita completa a necessidade das aulas”, acrescentou ele.

Nessa aula, em que Milton discorreu sobre a escrita do poema máximo da língua portuguesa, composto há quase 500, passei boa parte analisando essa assertiva do amigo Milton. Discordava com meus botões: se ele não se
acha escritor nem poeta, apenas um versejador, o que mais seria então? Lógico, um professor.

Se o professor tem uma missão transcendental, inspirar um ardente amor pela vida de estudos e pesquisas, escrever complementa essa vontade de se comunicar - argumentava comigo mesmo. Para se comunicar, com palavras que não foram colocadas no papel, o professor inspira estudantes e ouvintes a se tornarem alegres e fortes, a serem um instrumento do divino para a construção do edifício da vida. Por isso, sendo escritor ou não, o professor faz toda a diferença no processo de aprendizado.

Ele conhece o alcance das palavras, que podem ecoar nos corações como uma ferramenta transformadora. Talvez por isso, muitos preferem apenas se expressar com gestos e palavras, sem nunca colocar no papel seus pensamentos e reflexões.

Grandes professores são também excelentes escritores, pensadores, filósofos e poetas. E os temos aqui na Paraíba. Professores que exercem a atividade da escrita da melhor forma e com grande elegância de estilo, assim como de resto em nosso País. Basta citar, Alceu Amoroso Lima, Paulo Freyre, Antonio Candido. Eles exerceram as duas atividades nos mais gabaritados espaços das salas de aula e na imprensa.

Alceu Amoroso Lima / Paulo Freire / Antonio Candido CC0
Assim como o escritor, o professor é a ponte do diálogo entre o saber e a mente quase sempre vazia, evangelizando com seus conhecimentos e gestos.

Recomendava Alceu Amoroso Lima aos seus alunos: “Só escrevam quando não puderem deixar de escrever”. Mas ele nunca deixou de escrever, porque era um professor que sabia escrever. Justificava esse gesto como autor de tantos livros. Disse que escrevia o que pensava e sentia, e colocava no papel “como sentia e pensava”.

Escrevendo e expondo seu pensamento, o professor está nos ensinando. A qualidade intelectual
Milton Marques Júnior APL
dele é que conta, mesmo que não seja um escritor. O professor completo é aquele que se torna um pensador com múltiplos conhecimentos.

Para ficar com a prata da casa, destacaria alguns professores que integram a nossa Academia, todos de elevado senso crítico e sadios pensamentos, às vezes apresentados através da escrita rebuscada, que ajudam na formação de cidadãos e no acesso ao saber.

Em nossa Academia, temos alguns que souberam exercer com destaque as duas atividades – de professor e de escritor –, ganhando o reconhecimento porque dedicam seu tempo a escrever e ensinar. Portanto, estes nos ensinam de duas maneiras: com suas aulas e com suas palavras e pensamentos colocados no papel.

Quero acreditar que Milton se considera um escritor que não vive exclusivamente para escrever, como esses que tiram seu sustento dessa atividade. Mas é um professor, em tempo integral, que retira dessa atividade o pão de cada dia.

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