A energia de Carlos Aranha contagiou todos na noite em que lançou na Academia seu livro, “Nós / an insight” (poesia). Contagiou pri...

Aranha e a Academia

carlos aranha jornalismo cultural paraibano
A energia de Carlos Aranha contagiou todos na noite em que lançou na Academia seu livro, “Nós / an insight” (poesia). Contagiou principalmente a casa, que viu gente nova, de outras cogitações e auditórios, ocupando as cadeiras e reclamando a falta de espaços. Contagiou a crítica do acadêmico Hildeberto Barbosa, que foi da análise literária ao fervor poético.

Que livro? O da poesia peculiaríssima de toda uma vida engajada a seu modo no espírito da cidade, da sua gente, das suas artes, dos seus pecados e incertezas e, sobretudo, do seu tempo - até então enrustida numa crônica jornalística de
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quarenta anos – e só agora gritada num livrinho de cem páginas, o único dos muitos que o autor andou escrevendo no varejo diário do jornal e de onde se poderá extrair o seu perfil mais fiel.

Quando Aranha inscreveu-se para ingressar nos quadros da Academia, um de seus sócios mais ilustres cobrou de mim, que no conselho tinha dado parecer favorável, a observância do estatuto que exige do candidato a publicação de alguma obra notável. Aleguei, então, o livro diário que ele vem escrevendo, página por página, há quarenta anos, mais de duzentas páginas por ano, o mais fiel testemunho das aspirações e realizações culturais do seu tempo, camuflando as suas ideias e sentimentos, cogitações e decepções, alegrias e tristezas num jornalismo de influência direta na geração do tropicalismo.

Haveria livro maior? A diferença é que o autor não entrava no formato de livro, iniciativa que o leitor, a cidade cultural, vinha fazendo a varejo, dia a dia, ano a ano, a estante vazia mas o livro noutro suporte de fluxo contínuo. No livro-livro,
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Carlos Aranha Linkedin
neste que tenho em mãos somando os insights, digamos os guardados poéticos que o homem sensível e culto foi acumulando e resistindo liberar e onde não há lugar para a leitura maquinal, só levada pelo hábito.

É bom se deter atentamente nas palavras do prefácio de Walter Galvão, “roteiro do sentir pra pensar”, pois o Nordeste que o leitor vai encontrar, só como exemplo, não é o que a linguagem comum nos acostumou. O “gato / atravessando o coração / como se fosse / uma pantera azul / das neves do Kilimanjaro // /Segure o canto / e grite: / não se venda.”

Escrevi o que foi lido acima há dez anos, que pouco acrescenta à merecida consagração da imprensa ao jornalista, autor e ator cultural que foi Carlos Aranha, a não ser antecipar-me à ideia de uma releitura seletiva dos quarenta anos de colunismo cultural, tendo “Essas coisas”, na sua fase madura, a melhor fonte de sua pugna como jornalista e ator de ideias muito próprias.

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Belchior, Aranha, Gilberto Gil e Chico Pereira Arquivo A União
Concordando ou discordando de suas ideias e do seu modo de ver, invejava-o nisso de reunir a unanimidade quando sentava diante da máquina, escrevendo solto, sem amarras, numa desenvoltura responsável que fazia inveja aos melhores. Luiz Carlos Souza traz esse detalhe: “... era exímio, utilizando todos os dedos (...) ao mesmo tempo em que conversava sobre assunto completamente diferente.”

Morreu como no verso de um poeta que ele próprio me passou, numa antiga reunião do conselho da APL: “A noite deveria ser assim / um céu que pouco a pouco anoitecesse / e a gente nem soubesse que era o fim”.

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