Já é hora de dormir, Não espere mamãe mandar. Um bom sono pra você E um alegre despertar Jingle dos Cobertores Parahyba , décadas de...

Um Severo e dois Clementes

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Já é hora de dormir, Não espere mamãe mandar. Um bom sono pra você E um alegre despertar
Jingle dos Cobertores Parahyba, décadas de 1960-70

Fundada em 1925, a Tecelagem Parahyba foi durante décadas a principal indústria de São José dos Campos. Eram famosos seus cobertores e suas mantas, artigos que não faltavam em casas plantadas onde fizesse frio nesse Brasil afora. Durante muito tempo, tocada, ao que me consta, por Olivo Gomes, a Tecelagem, como era conhecida pelos joseenses, foi um sucesso empresarial. Não só isso, havia ali uma relação incomum para aqueles tempos entre o capital e o trabalho. Foram construídas duas vilas para abrigar as famílias dos tecelões. Como renda extra, os arremates nessas mantas eram feitos nas residências dos funcionários. Parte da família empenhava-se nessa tarefa devidamente remunerada.

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Tecelagem Parahyba, S. José dos Campos, 1930s ▪ YTube
Mas a “cereja desse bolo”, para mim, foi a 1ª Escola Mista da Tecelagem Parahyba. Destinada aos filhos dos empregados, aceitava, se houvesse vagas, crianças das imediações. Uma arquitetura moderna para suas quatro salas de aula, em que uma das paredes de cada um desses compartimentos era uma janela enorme, envidraçada, com uma visão mágica para um bosque frondoso que vicejava na lateral daquele educandário. Instalações sanitárias decentes, cozinha e refeitório. Havia ainda uma sala anexa, a do Jardim da Infância, para um experimento pedagógico que antecedeu a pré-escola. Estudei ali as três ultimas séries do primário. Foram-me tão marcantes esses poucos anos que ainda está aqui na memória o encantamento daqueles dias.

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Grupo Escolar Tecelagem Parahyba, 1950s / 1960s ▪ Imagens: Ex-Alunos e Professores do GETP
Imaginem uma escola, no caso privada e gratuita, que antes do início das aulas fornecia uma refeição aos alunos e um lanche no recreio das dez horas. Anexa à fabrica, ficava a fazenda Santana do Rio Abaixo, que parece-me vinha dos tempos coloniais, uma propriedade imensa que ia da indústria em questão às margens do Paraíba. A escola ficava estava plantada nessa fazenda, no caminho entre a vila dos funcionários e a fábrica.

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Grupo Escolar Tecelagem Parahyba, 1950s / 1960s ▪ Fonte: Ex-Alunos e Professores do GETP
Olivo Gomes, não sei quantos filhos teve. Soube de dois, o Clemente e o Severo. O Clemente se tornou o comandante daquele complexo e Severo foi para a política e acabou falecendo de acidente aéreo junto com Ulisses Guimarães. Entre os funcionários da Tecelagem rolava um chiste de que o Clemente era muito severo e o Severo muito clemente. O fato, triste por sinal, é que essa indústria não suportou a concorrência dos asiáticos e quebrou. O prédio da fábrica se transformou num centro cultural. Parte da fazenda, onde ficava a mansão dos Gomes é hoje um parque que recebeu o nome de quem concebeu seu paisagismo: Parque Roberto Burle Marx.

Residência de Olivo Gomes, no Parque Burle Marx, S.J dos Campos ▪ Fonte: FamilySearch + Wikimedia
Mas a vida, sabem como é, sem mais e nem menos, essas lembranças vieram-me à tona graças a um outro Clemente, não mais o Gomes, mas o Rosas. Explico.

Membro que sou do Conselho Editorial da Editora A União, chegou-me às mãos, dias atrás, um livro para que eu desse meu parecer. Tratava-se de uma obra, ainda sem um título definido, de menos de cem páginas, um opúsculo, como se diz no jargão editorial. Reunia uma série de ensaios acerca de literatura e outras demandas próximas a essas coisas das letras.

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Clemente Rosas, poeta e escritor
Resolvi dar de imediato, cabo à tarefa para não deixar essa incumbência para o afogadilho dos últimos dias do prazo que temos a cumprir. Que agradável surpresa. Comecei e já fui seduzido pela prosa fluente desse Clemente de quem, acreditem, eu ainda não ouvira falar. Inexplicável de minha parte. Texto onde tudo é claro, mas nada é superficial. Temas complexos que exigem conteúdo e lastro de quem ousa enfrentá-los.

Mas esse Clemente é um danado; pois, atravessa a vau o que para mim parece um curso caudaloso a exigir-me braçadas que nem sei se disponho de vigor para tanto. Faltou-me logo uma certeza, a de que se o analisador estaria à altura do analisado. Creio que não. Mas o dever de ofício obrigou-me a essas ousadias.

Se for dos meus pares do Conselho a mesma opinião que vou carimbar ao meu parecer, teremos brevemente nas livrarias uma obra consistente para a qual vale a pena debruçarmos nossa atenção. Eu já o fiz, lendo em estado original esse outro Clemente, o daqui e não o de lá. Recomendo.

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