Encontrar alegria em si mesmo é confrontar o abismo que somos. Não o temido vazio que nos consome, mas o abismo cotidiano, o espaço entre o que desejamos ser e o que efetivamente somos. É uma dança sutil entre a consciência de si e a infinita vastidão do sentir.
A alegria que buscamos não é a dos risos exuberantes ou dos êxtases passageiros, mas uma aceitação tranquila. Um "sim" silencioso ao que a vida oferece e ao que o mundo nos nega. É como redescobrir na alma uma fonte escondida, frequentemente encoberta por expectativas, desejos não realizados e o incessante ruído exterior. Esse processo demanda silêncio, introspecção e uma honestidade profunda sobre quem somos — e, talvez ainda mais importante, sobre quem nunca seremos. Acima de tudo, exige amor próprio.
Que alegria é essa, que não depende de conquistas ou satisfações exteriores? Quietude que só vem quando abandonamos as ilusões, ela não surge em momentos de glória ou sucessos retumbantes. Aparece no intervalo das coisas, no silêncio entre dois pensamentos. Paradoxalmente, nasce da aceitação de que o mundo valoriza muitas coisas sem grande sentido.
O cínico interior dirá o contrário. Vai sussurrar que as promessas assim soam como marketing de autoajuda. Mas então você se senta em silêncio, sozinho, e percebe que esse caminho é possível. Vive os dias um a um, lutando por sonhos possíveis, encontrando lampejos de graça nos lugares mais inesperados e se dando conta de que não precisa de permissão externa para ser feliz.
A alegria brota, discreta, quando nos permitimos o luxo da autenticidade, num mundo que exige máscaras. Ela resulta da reconciliação com nossas imperfeições, do reconhecimento de que ser humano é, por natureza, ser inacabado. Não significa negar as dificuldades ou fugir da dor, mas aceitar que prazer e sofrimento coexistem na vida. Alegria não é uma meta distante, mas um estado que podemos cultivar diariamente, ao olharmos para nós mesmos com ternura e paciência. Como o sol de inverno, que não aquece, mas ilumina o suficiente para seguirmos adiante.
Encontrar essa alegria é reconhecer que somos apenas um ponto no vasto tapete do mundo, e que esse simples existir já é um milagre. Uma aceitação suave, quase invisível, de que ainda estamos aqui — e que, de algum modo, isso basta.